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Refletida por segundos, levada à reflexão por horas

Na entrada da portaria do prédio onde moro, você sobe uma pequena rampa e encara a porta preta de vidro que te reflete. Dia desses, voltando do pilates (atividade que me remete completamente às senhorinhas), fui trilhando o mesmo caminho diário, de cabeça baixa. Ao chegar na porta, levantei o rosto e, não me pergunte por quê, me concentrei bem no meu reflexo. Mais especificamente, no rosto.
Ele estava enrugado, porém sereno. Olhos doces, com excesso de pele caindo pela lateral. Me assustei em menos de um segundo, sem entender o que havia acontecido com minha imagem refletida – ou a interpretação dela.
Até que, poucos segundos depois, vi que uma senhorinha, a vizinha que sempre desce para passear com sua “cuidadora”, estava exatamente no mesmo lugar que eu, do outro lado do vidro temperado. Nossos rostos se encontraram na exata posição, separadas por um vidro que deixava ver um pouco do que há do outro lado e o resto ficava à mercê do mistério.
Eis que acabei olhando por mais alguns segundos, até que a porta se abriu e nos fez encontrar uma com a outra, agora sem nada a nos impedir de interagir. Nos cumprimentamos, desejamos um bom dia uma à outra e seguimos nossos respectivos caminhos.
Desde o momento que atravessei a segunda porta, segui para o elevador e cheguei em casa… minha mente fantasiosa e que ama inventar reflexões me levou para tantos lugares que aquele micromomento de segundos me proporcionou. Me flagrei perdida, nos minutos seguintes, sobre como me vi nela, como a porta que nos separava era o tempo e como aquele momento-metáfora me impactou.
Pensei na solidão da velhice, na despedida da beleza, na chegada da humildade e sabedoria e em como quem não sabe lidar com perdas e mudanças sofre nessa fase. Pensei também no quanto o tempo tem passado rápido e que, realmente, já não sou tão jovem assim, por mais que o universo tenha me agraciado com uma pele geneticamente resistente ao tempo.
Senti medo, angústia e tristeza do futuro, confesso. Acho que isso fala muito de como me sinto no momento presente. Apesar de que, aos 32 anos, tenho algumas coisas em comum com aquela senhora, por mais que tema admitir. Moramos sozinhas no mesmo prédio e temos cuidadores. Os meus estão a ligações de distância e não me dão banho nem cozinham para mim. O cuidado hoje, seja de familiares ou amigos, virou atenção, suporte e apoio emocional e, claro, estrutural, quando necessário.
Sempre digo que é melhor estar sozinha agora do que quando velha. Tenho uma hipótese esperançosa de que o destino está me fazendo sentir a amargura da solidão nesse período, quando há carne fresca e disposição, em vez de quando tudo esfriar um pouco e se tornar um pouco mais difícil.
Flagro-me falando e pensando coisas assim quanto à velhice, inclusive. Um lugar sombrio, difícil, solitário. É o que a cultura nos vende ou a realidade? É para todos ou para alguns? É questão de livre-arbítrio ou destino findar a vida de forma angustiante ou plena? É uma reflexão política, inclusive.
Eu só sei que um mero reflexo de segundos me arrebatou décadas à frente do tempo. E eu me vi, no reflexo de hoje, mais bonita, inteligente e madura do que já fui.
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Esse texto é 100% autoral. Sua correção foi feita pelo ChatGPT.

 

 

 

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